Com a evolução da medicina no último século, seus meios de diagnósticos e tratamentos se tornaram mais eficazes. O câncer é diagnosticado cada vez mais precocemente e as chances de cura e tratamentos menos mutilantes aumentam ao longo do tempo. Porém, a palavra câncer ainda tem o seu estigma e tem o poder de gerar em cada individuo sentimentos mistos de medo, insegurança e indefinição. Medo do desconhecido ,do sofrimento , da morte , do porvir. Insegurança quanto a modalidade e eficiência do tratamento . Indefinição por se tratar de uma doença que ainda hoje continua mal compreendida e de evolução incerta.
A difícil jornada se inicia no momento da suspeita do diagnóstico . Penso sempre que todos já sabem a doença de que são portadores antes mesmo da suspeita médica. Se inicia um processo de desconforto e apreensão. O tempo que se passa entre a suspeita e a confirmação do diagnóstico é causador de sofrimentos e angústias.
Com a confirmação do diagnóstico o primeiro sentimento é de incredulidade. Será que é verdade? Isto está mesmo acontecendo comigo? Todas as informações dadas neste momento se tornam incompreensíveis , necessitando um tempo para serem elaboradas e apreendidas. Esta negação da doença pode levar a busca de outros profissionais, outras opiniões, geralmente com a esperança que o diagnóstico seja modificado ou negado.
Constatado o fato , muitas vezes a negação cede lugar a revolta. Porque eu ? Logo eu ? E a jornada prossegue muitas vezes acompanhada de insegurança em relação ao profissional que nos trata, ao tratamento proposto e ao local de sua realização. Quando o paciente tem um plano de saúde privado conta com opções e poder de escolha, o mesmo não ocorrendo quando está na dependência total da vaga e da disponibilidade do serviço público . É o tempo de espera ! Este período da espera do início do tratamento é o que apresenta maior grau de estresse e sofrimento para o portador de câncer.
A jornada continua com o tratamento . Na maioria das vezes iniciando com cirurgias , algumas mutilantes. Começa-se a lidar com os efeitos colaterais adversos dos tratamentos e a disponibilidade total do tempo dedicado á doença.Deixa-se os afazeres da vida cotidiana, compromissos e planos ficam para depois, em um futuro incerto . Esta fase pode gerar sentimentos de barganha , de trocas, de promessas . Se ficar bom irei mudar de vida, ser alguém melhor, irei à igreja, etc. A qualquer momento da jornada podem ser desencadeados processos depressivos , que devem ser diagnosticados e tratados.
Acaba o tratamento , mas não é o fim da jornada. Agora é a hora da recuperação dos efeitos e sequelas dos tratamentos e a readaptação a vida cotidiana. Sentimentos de incerteza podem acompanhar esta nova fase.
A jornada se torna mais fácil quando se atinge a aceitação da doença com entendimento e o conhecimento da mesma da forma levando –se a compreensão da forma como ela se apresenta . Por ter sempre caráter individual , a doença de um é diferente da doença do outro . Quando o paciente é esclarecido e informado ,durante todo o processo , ele se torna mais participativo , diminuindo sua angústia e sofrimento.
Uma doença como o câncer não afeta apenas a parte física de um indivíduo , afeta-o em toda a sua integralidade :Física, social , familiar , profissional e emocional , portanto a sua jornada deve ser acompanhada por uma equipe multiprofissional , que o acompanhará por todo seu trajeto , cuidando sempre em todas as fases da doença e lhe dando suporte para o retorno à sua vida cotidiana .
A construção de um hospital que visa atender a todas as necessidades dos pacientes portadores de câncer, desde o acesso ao diagnóstico precoce , o atendimento sem grandes esperas , o tratamento realizado por profissionais especializados e uma equipe multiprofissional , visando atender ao paciente integralmente ,é um grande avanço e uma grande conquista para toda a nossa região . Com certeza mudará a trajetória dos pacientes portadores de câncer e tornará a sua jornada muito mais fácil de ser percorrida.
* A Dra. Maria Assunção Azevedo Guedes é Mastologista em Presidente Prudente; especialização em cuidados paliativos; fundadora do grupo de apoio à pacientes portadoras do câncer de mama Amigas do Peito